sexta-feira, 27 de março de 2009

"Este céu passará e então
teu riso descerá dos montes pelos rios
até desaguar no nosso coração"
(Ruy Belo)

terça-feira, 24 de março de 2009

Eu sei, mas não devia
(Marina Colasanti)
"Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia. A gente se acostuma a morar em apartamento de fundos e a não ter outra vista que não seja as janelas ao redor. E porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E porque não olha para fora logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E porque não abre as cortinas logo se acostuma acender mais cedo a luz. E a medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão. A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora. A tomar café correndo porque está atrasado. A ler jornal no ônibus porque não pode perder tempo da viagem. A comer sanduíche porque não dá pra almoçar. A sair do trabalho porque já é noite. A cochilar no ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia. A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra. E aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja número para os mortos. E aceitando os números aceita não acreditar nas negociações de paz, aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração. A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto. A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita. A lutar para ganhar o dinheiro com que pagar. E a ganhar menos do que precisa. E a fazer filas para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagará mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas que se cobra. A gente se acostuma a andar na rua e a ver cartazes. A abrir as revistas e a ver anúncios. A ligar a televisão e a ver comerciais. A ir ao cinema e engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos. A gente se acostuma à poluição. As salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro. A luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Às bactérias da água potável. A contaminação da água do mar. A lenta morte dos rios. Se acostuma a não ouvir o passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães, a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta. A gente se acostuma a coisas demais para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai se afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema está cheio a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada a gente só molha os pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado. A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se da faca e da baioneta, para poupar o peito.
A gente se acostuma para poupar a vida que aos poucos se gasta e, que gasta, de tanto acostumar, se perde de si mesma."

quinta-feira, 19 de março de 2009

Le Vampire
Toi qui, comme un coup de couteau,
Dans mon coeur plaintif es entrée;
Toi qui, forte comme un troupeau
De démons, vins, folle et parée,
De mon esprit humilié
Faire ton lit et ton domaine;
— Infâme à qui je suis lié
Comme le forçat à la chaîne,
Comme au jeu le joueur têtu,
Comme à la bouteille l'ivrogne,
Comme aux vermines la charogne
— Maudite, maudite sois-tu!
J'ai prié le glaive rapide
De conquérir ma liberté,
Et j'ai dit au poison perfide
De secourir ma lâcheté.
Hélas! le poison et le glaive
M'ont pris en dédain et m'ont dit:
«Tu n'es pas digne qu'on t'enlève
À ton esclavage maudit,
Imbécile! — de son empire
Si nos efforts te délivraient,
Tes baisers ressusciteraient
Le cadavre de ton vampire!»
(Charles Baudelaire)


quarta-feira, 11 de março de 2009

11h13... não são os verdadeiramente talentosos e criativos que se dão bem na vida, mas os 'esforçados' - aqueles que se matavam de estudar na escola, não os inteligentes que aprendiam naturalmente, só prestando atenção às aulas. Sobem na vida os que ficam até tarde no trabalho 'fazendo média', ainda que, na verdade, vivam pendurados ao telefone ou na internet com amigos e parentes o dia inteiro. Sim, sim, o mundo é dos espertos!
Deixei de ouvir-te

"Deixei de ouvir-te.
E sei que sou mais triste com o teu silêncio.
Preferia pensar que só adormeceste;
mas se encostar ao teu pulso o meu ouvido
não escutarei senão a minha dor.
Deus precisou de ti, bem sei.
E não vejo como censurá-lo
ou perdoar-lhe"

(Maria do Rosário Pedreira)

terça-feira, 10 de março de 2009

Retrato (Cecília Meireles)

"Eu não tinha este rosto de hoje,
Assim calmo, assim triste, assim magro,
Nem estes olhos tão vazios,
Nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,
Tão paradas e frias e mortas;
Eu não tinha este coração
Que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,
Tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida
A minha face?"

... reparei outro dia que as minhas mãos estão envelhecendo... quando eu era mais nova gostava da frase (não sei de quem): "não me importo que minha história se desenhe no meu rosto, desde que seja uma história bonita". Não tenho rugas, não tenho marcas de expressão, não tenho história. Mas as minhas mãos estão começando a discordar da idade que meu rosto decidiu manter.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Procimax

- O que é? O Procimax é o citalopram, uma antidepressivo inibidor da recaptação da serotonina.

- Para que serve? Sua principal finalidade é tratar todas as formas de depressão, exceto as presentes nos ciclos rápidos do transtorno afetivo bipolar (antiga PMD). Vem sendo recomendado também para tratar problemas de conduta em pacientes demenciados.

Pacientes demenciados?! Whatever... são 40mg diárias sem as quais eu não estaria conseguindo sair da cama! Nem toda erva-de-são-joão do mundo fariam o mesmo por mim... psicofármacos, salve!

terça-feira, 3 de março de 2009


09h41... hoje faz um mês que a Nina morreu... mas a essa mesma hora (qualquer minuto antes das 15h) ainda havia esperanças... saudades da minha fofinha, muita saudade!


segunda-feira, 2 de março de 2009

14h16... hoje eu peguei o mesmo taxi de 3 de fevereiro, a manhã em que eu deixei a Nina na clínica antes de ir pro aeroporto... o motorista perguntou dela, claro, disse que até pensou em me ligar pra saber o que tinha acontecido... foi um déjà vu triste... a esta hora, um mês atrás, minha florzinha ainda estava viva... queria que a teoria das supercordas fosse real e aplicável, queria pular pra outra dimensão onde eu tivesse feito a escolha certa...